terça-feira, 25 de maio de 2010

...

O dia estava quente. Era um calor insuportável, daqueles que só se vê no verão carioca. A impressão que tinha era que o próprio Lúcifer estava ao seu lado, queimando seu pescoço com a ponta dos dedos. Ele estava na praia, tomando água de coco e aproveitando pra relaxar.
Há pouco tempo havia passado horas preso na alfândega como suspeito de terrorismo. Foi interrogado, torturado, perdeu o pouco de dignidade que lhe restava, mas não confessou. Eles o ameaçaram, ameaçaram sua família, disseram ter provas suficientes para lhe mandar para a cadeira elétrica. E ele se manteve impassível, olhando um ponto fictício na parede, logo atrás da cabeça do grandalhão que o socava.
Ficaram nessa brincadeira por um dia inteiro. Paravam apenas quando um dos manda-chuvas precisava se aliviar ou comer alguma coisa. Nesses momentos, os minutos passavam depressa e ele mal conseguia se recompor. Em compensação, quando o “interrogatório” recomeçava, as horas pareciam dias e dias. Mas ele manteve sua postura, tentando recuperar a dignidade que lhe usurparam, lutando com unhas e dentes para não perder o amor próprio. Seu orgulho e seu ego super-inflado foram imprescindíveis nesses momentos. De tempos em tempos ele pensava que não suportaria mais aquilo, mas então, um dos carrascos dizia alguma coisa que o fazia lembrar o motivo daquilo tudo. E ele agüentava calado.
Sua situação era deplorável, já tinha a mão direita e o nariz quebrados, as pernas dormentes e o rosto lavando em sangue, que escorria de diversos cortes em pontos diferentes de sua cabeça. Estava preso a algemas no teto da sala, por isso, suas costelas eram alvos fáceis. Tinha uma mancha preta em cada lado do corpo, do tamanho de seu troco. Mas continuava fitando o ponto imaginário na parede, sem nada dizer.
Após um dia inteiro de silêncio, o ministro da defesa em pessoa apareceu na sala e arriscou umas porradas na cara daquele pedaço de nada que se atrevia a se opor ao sistema. Mas ele era diferente: era de uma calma inabalável e, tinha na face a expressão de quem não hesitaria em matá-lo se fosse preciso, para saber o paradeiro de Paulo “The Torch Man” dos Santos - o maior traficante brasileiro, acusado de explodir boates e restaurantes por toda América e matar diversos políticos americanos.